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Fernando Cortezi/27 de jan. de 2018

Qualidade de Morte das Organizações

Aprendi com uma talentosa médica, amiga e colega de doutorado, que precisamos cuidar não só de nossa qualidade de vida, mas também da qualidade de nossa morte.

Nosso finamento pode ser como a morte de um passarinho, como diz a velha expressão, ou um horror. É bem verdade, creio eu, que só Deus sabe exatamente como e quando será o nosso fim. Para os afeiçoados à gestão da saúde, especialistas indicam o que podemos fazer para aprimorar a qualidade de nossas vidas e a qualidade do nosso fim.

Em suma, para nós, a morte tem que ser encarada não como o oposto de vida, mas como parte dela. Mas sobre nós, especialmente sobre a nossa saúde, vida e morte eu deixo a minha amiga Dra. Claudinha falar com a tamanha competência que Deus lhe deu. Meu ensaio de hoje é sobre a qualidade da morte das organizações.

Alguns pesquisadores defendem que assim como os seres vivos, as organizações também têm um ciclo de vida, ou seja, nascem, se desenvolvem, crescem, amadurecem e morrem. Algumas empresas são longevas, centenárias, até mesmo milenares. Outras, infelizmente a grande maioria, têm vida curta.

A mais recente pesquisa realizada pelo Sebrae indica que 23% das empresas brasileiras de todos os portes são extintas em menos de dois anos. Neste mesmo pequeno período de apenas um par de anos, metade das microempresas brasileiras morrem.

As consequências da extinção de uma empresa foram discutidas de uma forma geral e resumida no ensaio anterior. Neste ensaio, refletimos sobre a seguinte questão: como escolher as melhores estratégias para uma empresa que enfrenta o declínio de seus negócios?

A melhor solução para o enfrentamento de crises que podem levar à extinção de uma empresa é evidentemente a prevenção. Ao contrário do que muitos pensam, crises geralmente não acontecem de forma abrupta e inesperada. A gestão profissional é capaz de identificar sinais de desafios e oportunidades que podem surgir no futuro próximo.

O espírito empreendedor é fundamental para manter uma organização viva, devendo estar presente na organização durante toda a sua existência. Além disto, alguns processos e ferramentas permitem que o gestor se prepare melhor para o fim ou, preferencialmente, para o início de uma nova e promissora etapa dos negócios. Alguns exemplos são o uso de análise de cenários, planejamento e controle do desempenho estratégico e financeiro, inteligência competitiva com alertas antecipados de sinais de mercado, dentre outras ferramentas úteis para antecipar possíveis rupturas e identificar oportunidades de novos rumos.

O declínio pode estar relacionado com a má gestão da empresa, mas pode também estar associado a motivos que vão além das fronteiras da empresa. Questões tecnológicas, que implicam em substituição do produto ou serviço atualmente comercializado por outro tecnologicamente superior a um preço compensador, questões demográficas relacionadas à redução da população de clientes ou mudança de suas necessidades são algumas razões que levam ao declive das atividades de um setor. Por ora, assumimos que o declínio da empresa se aproxima. O que fazer?

“São vários os elementos que precisam ser analisados em uma situação em que os negócios declinam”

São vários os elementos que precisam ser analisados em uma situação em que os negócios declinam. A depender da análise, sobretudo dos pontos discutidos abaixo, a estratégia recomendada é distinta.

Um desses pontos refere-se às condições da demanda, especialmente as incertezas acerca da continuidade ou não de sua redução, de sua velocidade e do seu padrão do declínio. A queda das vendas pode ser muito provável ou incerta, rápida ou vagarosa, errática ou gradativa.

O valor do mercado remanescente para a empresa e seus competidores ao longo do tempo é outro fator importante, que indica a potencial rentabilidade do negócio e o possível comportamento dos concorrentes que lutam pela sobrevivência. Ambos, o valor de mercado e o comportamento da competição, devem ser analisados e com frequência reavaliados antes de se definir que estratégia adotar.

É fundamental também examinar as barreiras de saída, ou seja, identificar o quão difícil é sair do mercado. Algumas vezes as barreiras de saída são altas porque os ativos da organização são muito especializados, não havendo liquidez no mercado para vendas de máquinas, equipamentos e outros tipos de ativo específicos do negócio.

As barreiras de saída podem também estar relacionadas com aspectos comportamentais ou emocionais do dono ou do gerente do negócio, que resiste em assumir a queda. Grupos sociais ou o governo podem exercer pressões a depender, por exemplo, do número de empregos que está em jogo, sendo portanto possíveis barreiras de saída a serem consideradas.

Finalmente, um custo fixo alto para sair do negócio pode ser outro importante entrave. Por exemplo, ao encerrar a empresa, os empregados geralmente têm direito à indenização integral, que inclui aviso prévio, 13º salário, férias proporcionais e liberação do FGTS com pagamento de multa. Os custos de advogados e contadores que dão suporte ao fechamento podem ser impeditivos. Contratos em vigor, de diversas naturezas, não somente trabalhistas, precisam ser respeitados e multas significativas podem ser incorridas.

Antes da decisão é preciso avaliar as consequências decorrentes da divulgação da estratégia da empresa que enfrenta uma situação de declínio. Após anunciada a saída do negócio, a produtividade dos empregados pode cair, talentos podem sair da empresa e resultados financeiros podem se deteriorar. Clientes podem buscar no mercado alternativas de suprimento, podendo reduzir ainda mais a demanda e fornecedores podem perder o interesse em fazer negócios com a empresa.

“é importante que uma boa estratégia seja logo definida”

Tudo isto e outros aspectos têm que ser considerados. No entanto, é importante que uma boa estratégia seja logo definida, caso contrário, há o risco do surgimento da chamada "empresa fracassada permanentemente" (em inglês estas empresas são denominadas “PFOs” ou "permanently failing organizations"). Há algumas PFOs por aí. Elas podem sobreviver ou se arrastarem por anos a fio, mas com saúde financeira e organizacional deploráveis.

Para não ser uma PFO, o bom e velho Porter sugere algumas estratégias, todas elas aplicáveis aos negócios dos dias de hoje. A escolha de uma ou outra depende da situação da empresa no mercado, especialmente no que se refere aos pontos já discutidos.

Para começar, é importante que esses pontos discutidos e certamente outros indiquem ao gestor se, apesar das circunstâncias, a estrutura do declínio é favorável. Isto pode ocorrer, por exemplo, quando a incerteza não é tão grande, as barreiras de saída não são altas e quando há pontos fortes que a empresa apresenta em relação aos seus concorrentes. Depois desta análise, fica mais fácil tomar a decisão sobre qual das quatro estratégias indicadas deve ser adotada.

A primeira estratégia é buscar a liderança em termos de participação de mercado. A idéia é tirar vantagem do declínio do setor para assumir a ponta, considerando que seja viável se obter lucro nesta situação. A segunda estratégia possível é a de nicho, ou seja, criar e defender uma forte posição em um determinado segmento mais atrativo do que a média do setor em declínio.

A terceira possiblidade é a estratégia de colheita, ou seja, fazer uso dos pontos fortes da empresa e gerenciar o desinvestimento de forma controlada. Desta forma, a empresa elimina ou restringe novos investimentos, corta cautelosamente os custos de manutenção de suas instalações, procura utilizar os seus pontos fortes para aumentar o valor e o preço de seus produtos ou reduzir o custo ou nível de serviços, a depender das necessidades do cliente, podendo enxugar o seu portfolio, limitar canais utilizados, dentre outras medidas.

Por fim, a última estratégia sugerida sugerida por Porter é desinvestir rapidamente. A idéia é vender o negócio tão logo o declínio seja detectado, o que geralmente maximiza o valor que a empresa poderia realizar nestas situações. O motivo é que, neste caso, haveria incerteza acerca da ocorrência ou não do declínio e, assim, pode haver investidor que faça uma boa aposta na reversão, fazendo a aquisição do negócio.

“O melhor fim é aquele que dá início a um novo ciclo de negócios”

O melhor fim é aquele que dá início a um novo ciclo de negócios, sem a necessidade de se fechar as portas, demitir empregados, deteriorar relações com clientes, ficar devendo a fornecedores e credores, denegrindo a imagem da organização e de seus profissionais. O seguinte quadro resume as estratégias indicadas para aumentar as chances de sucesso em cada condição de mercado identificada pelo gestor.

Bom seria se a nossa morte pudesse ser de fato bem gerenciada por nós como é possível gerenciar a morte das organizações. Certamente a Dra. Claudinha pode nos ajudar a cuidar bem de nossa sobrevivência e do nosso fim. Pesquiso, estudo e compartilho conhecimento especificamente para que cuidemos bem da sobrevivência das organizações. Creio ser fundamental cuidar da saúde dos negócios e consequentemente do bem estar das pessoas que deles dependem, sejam empreendedores, investidores, clientes, fornecedores, funcionários, familiares e outros que direta ou indiretamente podem sofrer com a morte organizacional.

Que os nossos ocasos e os das organizações ligadas a nós aconteçam quando estivermos fartos de dias. Tenho fé que triunfantes vitórias virão através de estratégias bem sucedidas, fruto do nosso conhecimento, trabalho, esforço, talento e graça de Deus.

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